A agenda de Delfino Golfeto é atribulada, como a de qualquer presidente de empresa: são viagens, reuniões, visitas a fornecedores e franqueados, inaugurações e muitas participações em eventos, normalmente como palestrante. Porém, com algumas peculiaridades: hoje, ele se permite alguns prazeres, como pilotar os próprios aviões, rolar no chão em divertidas brincadeiras com os netos e, diariamente, degustar um dedinho de algumas das melhores cachaças que existem. “Mas, é só um pouquinho mesmo, de maneira prazerosa e também para não perder o apuro do paladar”, explica.
O presidente da Água Doce – Sabores do Brasil hoje mal tem tempo de dar entrevistas para relembrar o início de seu passado empreendedor. O cotidiano sempre foi corrido para o menino nascido em Adamantina, que cedo se mudou com a família para Tupã. O pai queria que os filhos aprendessem desde muito jovens a se sustentar, então, ainda criança, Golfeto trabalhava na lavoura, como cortador de cana. Foi assim, de uma forma que poderia ser considerada triste e difícil, que ele começou a definir o empreendedor em que se tornou. “Como meus familiares, trabalhava alegremente de sol a sol na lavoura e estudava à noite. Fui boia-fria na colheita de cana, mas sempre dando o melhor de mim. Nunca trabalhei como um robô, gostava de saber o que estava fazendo e para quê”, conta o empresário.
A paixão pelo cultivo do açúcar e álcool e seu uso começou a se revelar desde cedo e trabalhar com isso se tornou um sonho a ser alcançado. Ao terminar o ensino médio, Golfeto procurou um curso técnico na área, e foi para a renomada Escola de Agronomia Luiz de Queiroz, de Piracicaba, a Esalq: “Saí de lá já empregado. Entre 1978 e 1990, fui gerente de uma usina e a atividade exigia que visitasse muitos bares. Nessa época já acalentava o sonho de abrir um estabelecimento que servisse bebida e comida de qualidade e atendesse de maneira profissional, ao contrário de muitos que conhecia”.
Foi também nesse período que ele viu o mercado da indústria alcooleira fazer uma autosseleção: “Pequenos sitiantes sem qualificação foram eliminados e só permaneceram os poucos bons”. Os conhecimentos, a ousadia e os contatos – Golfeto sempre foi sociável – levaram o futuro empresário a abandonar a promissora carreira administrativa e arriscar a abertura de negócio próprio. “Empreendedor primeiro faz, depois se preocupa em pagar. Com excesso de zelo, não se cria nada”, assinala Golfeto, em uma de suas muitas conclusões sobre a vida de empresário.
Paralelamente, Golfeto criou o hobby de degustar cachaças e classificá-las. Tornou-se um especialista no assunto e conhecia desde pequenos produtores até as marcas mais famosas. Ele se tornou um conhecedor tão profundo da cachaça que ganhou o título de “o Embaixador da Cachaça no Brasil” dentro do segmento.
Em família – Em 1990, abriu na garagem de casa, em Tupã, a Água Doce Aguardenteria. Sua facilidade para selecionar boas bebidas, aliada à boa mão da esposa Silvia Maria para quitutes, ajudou a fazer a fama. Em um pequeno balcão improvisado, ele servia cachaças e coquetéis inovadores para degustação. “Os clientes sempre levavam algum produto, nem que fosse o mais barato. O importante foi a divulgação boca a boca, o que me permitiu expandir o negócio”, conta, orgulhoso.
Dois anos depois, com o negócio consolidado, chegou o momento de criar a Água Doce Cachaçaria e seu sistema de franquias, que em apenas doze meses fez surgir doze lojas. “Como aprendi a ganhar a vida em família, chamei meu primo Júlio Bertolucci, administrador pós-graduado em marketing, que se tornou diretor de franquias. Poderíamos ter 300 unidades, mas com os custos mais altos e a sofisticação, ficou caro abrir uma casa. As primeiras puderam ser abertas com apenas R$ 50 mil. Mas, hoje, o investimento médio chega a R$ 2 milhões e temos pelo menos dez lojas que custaram mais do que isso”, observa. Ele avisa aos candidatos a franqueados que o retorno se dá em, no máximo, 36 meses. Anos depois, o nome da empresa foi levemente modificado, tornando-se Água Doce – Sabores do Brasil.
Golfeto mantém seu quartel-general – no trabalho e na vida pessoal – em Tupã. A esposa Silvia Maria é gerente da unidade piloto móvel; o filho, Adriano Luiz, administrador, atua na gestão da rede; e a filha Andressa, estudante de Nutrição, também trabalha na empresa. A necessidade de viagens frequentes o levou a comprar um avião bimotor para permitir-lhe visitar com agilidade os franqueados em todo o País. “Tupã é minha história. Lá iniciei minhas atividades, criei minha família e o Museu da Cachaça, onde exponho minha coleção de 2 mil garrafas de cachaças raras e conto a história da bebida e da própria Água Doce”, revela.
Os anos 2000, com o país mais estável e a política econômica em expansão, trouxeram a Golfeto ainda mais ânimo. Decreto assinado em 2001 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso institucionalizou a cachaça como a bebida genuinamente brasileira. O empresário havia lutado muitos anos ao lado de produtores do ramo para conquistar o título, a exemplo do champanhe francês e da vodca russa. Cinco anos se passaram e chegou outra conquista: o Selo Excelência em Franchising, conferido anualmente às melhores franquias pela ABF (Associação Brasileira de Franchising) por seu desempenho. “Esse foi o primeiro, acabamos de ganhar outro neste ano”, brinda, orgulhoso.
Em 2013, a Água Doce foi eleita pela ABF – Associação Brasileira de Franchising como a melhor franqueadora do Brasil, motivo de mais orgulho e que leva a empresa a se aperfeiçoar a cada dia. “Não podemos decepcionar quem nos motiva, os franqueados”, diz.
Água Doce vai muito além da cachaça – Embora já tenha levado cachaça no nome, a bebida é responsável por apenas 3% do faturamento da rede. Cada loja dispõe, em média, de 100 rótulos, incluindo seis de marca própria. Praticamente todos os dias, Golfeto prova novas cachaças enviadas por fabricantes. “Se eu não bebesse, não seria chamado no meio de ‘Embaixador da Cachaça no Brasil’ [título conquistado por seus conhecimentos da bebida]. Para degustar a cachaça, é preciso saboreá-la primeiro na ponta da língua, levá-la para os lados esquerdo e direito e depois para o centro. Se não engolir, não há como sentir sua acidez. Mas é só um dedinho”, esclarece.
Na verdade, o título de Embaixador, conferido informalmente a Golfeto, deve-se principalmente à sofisticação que começou a surgir a partir de suas ações. Ele tirou a cachaça do “limbo” em que se encontrava, sempre alvo de preconceitos e discriminações. Afinal, o maior consumidor da “marvada pinga” sempre foram os frequentadores de botecos. Com sua movimentação, isso mudou: “Sempre fiz questão de qualificar a cachaça bem produzida, atribuindo à bebida o prestígio que merece”.
O futuro de Delfino Golfeto é indefinido, como ele mesmo costuma dizer. O que sabe, mesmo, é que seus três netos o esperam em Tupã, para uma divertida farra no gramado de casa.
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