Donos de restaurante enfrentam rotina intensa e lucro líquido abaixo de dez por cento

Com margens apertadas e custos invisíveis, setor de alimentação vive ilusão de rentabilidade; especialista defende gestão transparente para engajar equipes e garantir sustentabilidade

Diferente do imaginário popular, o dono de restaurante no Brasil não nada em dinheiro. Segundo o empresário e professor Marcelo Marani, fundador da Donos de Restaurantes, escola de capacitação para o setor com atuação em toda a América Latina, o lucro líquido médio dos restaurantes que conseguem operar com saldo positivo não ultrapassou 10% em 2024. “Essa é a média para quem deu certo. A maior parte ou está no prejuízo ou no zero a zero”, afirma.

O dado contrasta com a percepção de boa parte da população. Marani relata que, ao perguntar para seus funcionários quanto sobra para o dono de cada real faturado, as respostas variaram entre 20% e 30%. “Quando revelei que, na realidade, sobra menos de R$ 0,10 por real faturado, o choque foi generalizado. Essa distorção de percepção mostra o quanto é importante envolver a equipe na gestão do negócio”, aponta.

A diferença entre expectativa e realidade financeira no foodservice brasileiro é explicada, segundo ele, pela falta de controle de custos e pela invisibilidade de pequenas perdas do dia a dia. Talheres extraviados, pratos quebrados, ingredientes desperdiçados e taxas de cartão não são percebidos como prejuízo direto, mas somados têm alto impacto. “Só com talheres perdidos, um restaurante médio pode gastar mais de R$ 5 mil ao ano. E quase ninguém monitora isso”, exemplifica.

Marani defende uma gestão baseada na transparência com o time. Em seus restaurantes, cada colaborador tem acesso aos custos operacionais e entende como suas ações impactam o resultado. “Mostramos até quanto pagamos por cada saco de lixo ou pela taxa de entrega. A equipe precisa enxergar a conexão entre o que faz e o que sobra para o negócio.”

A lógica, segundo ele, não é de punição, mas de protagonismo. Estabelecimentos que conseguem engajar a equipe na redução de desperdícios conseguem investir mais em premiações, bonificações e melhorias no ambiente de trabalho. “Já tivemos funcionários que compraram casa, viajaram, conquistaram metas pessoais porque o negócio gerou caixa suficiente para reconhecer o esforço coletivo”, diz o especialista.

A busca por eficiência, no entanto, exige mais do que economizar em insumos. Exige processos estruturados, padronização e tecnologia. A falta de controle do fluxo de caixa, por exemplo, ainda é um dos principais fatores de falência entre pequenos e médios restaurantes no país, segundo levantamento do Sebrae. “Muitos vendem bem, mas não têm dinheiro em caixa porque não projetam receitas nem monitoram gastos em tempo real”, alerta Marani.

O cenário econômico também não ajuda. Com inflação persistente, alta nos custos de energia, alimentos e folha salarial, as margens do setor seguem pressionadas. Dados da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel) apontam que mais de 35% dos estabelecimentos operaram no vermelho ao longo de 2023. Para sobreviver, os empresários precisam aprimorar sua gestão, e não apenas esperar o movimento aumentar.

Na avaliação de Marani, o lucro precisa ser encarado como ferramenta de transformação, e não apenas como remuneração do dono. “É ele que permite trocar equipamentos, fazer treinamentos, contratar melhor. Se não houver sobra no fim do mês, o restaurante se torna uma prisão, e não um negócio sustentável”, resume.

Com mais de 25 anos de atuação no setor, o especialista defende que o primeiro passo para mudar esse cenário é abrir o jogo com a equipe. “Quando o garçom entende que um pedido errado impacta o caixa, ele erra menos. Quando a cozinheira sabe que o desperdício custa, ela calcula melhor. Gestão não é só número: é cultura.”

Além da transparência, Marani defende a criação de metas operacionais tangíveis como ferramenta de engajamento. Em seus treinamentos, propõe indicadores que vão além do faturamento, como taxa de perda por desperdício, custo por cliente atendido e produtividade por hora trabalhada. “O time precisa ver o que está no controle dele. Reduzir perda de guardanapo, evitar retrabalho no pedido, usar o estoque com inteligência, tudo isso pode ser mensurado e premiado. Quando a equipe entende que cada detalhe afeta o resultado, o comportamento muda”, afirma.

Outro ponto sensível é a ilusão de que volume de vendas garante saúde financeira. Marani alerta que muitos empresários se contentam em ver o salão cheio ou o delivery disparando sem verificar se a operação está, de fato, gerando margem. “Já vi restaurante com fila na porta, mas com prejuízo no fechamento. Se não houver cálculo correto de custo por prato, precificação estratégica e análise de margem de contribuição, o negócio pode vender muito e quebrar rápido”, alerta. Para ele, o lucro não deve ser um bônus ocasional, mas um objetivo diário da gestão.

Sobre Marcelo Marani

Marcelo Marani é fundador e CEO da Donos de Restaurantes, uma das principais escolas para donos de restaurantes da América Latina. Professor formado em Ciência da Computação, com mestrado em Administração de Empresas, defendeu em 2007 uma tese que mostrava que 70% dos donos de restaurantes não trabalham com qualquer tipo de fidelização.

Empresário, sócio de mais de 10 empresas do foodservice, com um faturamento de R$30MM em 2024, tem mais 25 anos de experiência no mercado de alimentação e é considerado um dos maiores especialistas em gestão e aumento de faturamento para restaurantes do Brasil.

Marani é também apresentador de TV, no programa Café com Chef da Band todo domingo de manhã, é host do podcast mais escutado no Brasil para donos de restaurantes e também autor do livro Transforme o seu Restaurante em um Negócio Milionário, da editora Gente.

Marani já treinou mais de 25 mil empresários, em 19 capitais do Brasil, e já fez trabalhos em Portugal e na Argentina.