“Se arrependimento matasse…” Quem nunca ouviu essa frase? Todo mundo! Mas pouco pararam para pensar nas consequências dela no contexto de investimentos financeiro. Como evitar ou minimizar prejuízo quando surge a vontade de voltar atrás? Como se prevenir antes que isso aconteça? As questões começam a surgir sem parar ao examinarmos o tema.
Por isso, conversamos com a advogada Thereza Curi Abranches, do escritório Kasznar Leonardos Advogados, especialista que atua em áreas que incluem transferência de tecnologia, franquias e licenciamentos, direito autoral, dentre outras. A especialista respondeu essas e outras questões com profundidade, eliminado dúvidas e esclarecendo os pontos fundamentais sobre o tema.
Confira a entrevista.
Mapa das Franquias: O que acontece caso o franqueado desista da franquia depois de ter assinado o contrato? Essa possibilidade tem que constar do contrato ou não necessariamente?
Thereza Curi Abranches: Caso o Franqueado desista da Franquia depois de ter assinado o Contrato, serão aplicáveis as cláusulas e penalidades de rescisão previamente estabelecidas no documento, ou seja, se o compromisso já foi firmado, o que vai valer é o que está acordado.
O ideal é que esta possibilidade conste do contrato para que o Franqueado tenha ciência das penalidades envolvidas, embora a inclusão da mesma não seja obrigatória.
Como na franquia o relacionamento é de médio a longo prazo, o candidato deve avaliar tudo muito bem antes da assinatura do Contrato e, se tiver dúvidas, é melhor não arriscar. Arrepender-se após a tomada da decisão pode representar para o Franqueado uma perda relevante do investimento realizado, além da obrigação de pagamento de multas e indenizações que tiverem sido estipuladas no Contrato.
Mapa das Franquias:: Que tipo de cláusulas de rompimento são comuns no mercado? Ao que o franqueado deve estar atento?
Thereza Curi Abranches: As cláusulas de rompimento normalmente utilizadas são, de um lado, as de rescisão imotivada (denúncia vazia), ou seja, qualquer das partes sem justo motivo pode resilir o contrato desde que envie notificação prévia a outra parte podendo ou não serem aplicáveis multas e indenizações tendo em vista os investimentos realizados, e de outro lado, as de rescisão motivada(denúncia cheia), quando uma das partes requerer a rescisão do contrato por justo motivo, qual seja: o descumprimento/ infração do contrato pela outra, sendo aplicáveis as multas e indenizações estabelecidas no Contrato.
O Franqueado deverá estar atento sobre o que foi acordado nas cláusulas de rescisão do contrato de franquia, ou seja, deverá estar ciente sobre os prazos de notificação e aviso a serem cumpridos, sobre as multas e indenizações cabíveis, bem como eventuais penalidades aplicadas, como por exemplo, a existência de “cláusulas de raio”, que tem o intuito de delimitar um território no qual o ex-Franqueado está proibido de montar um novo negócio que siga o mesmo ramo de atuação do Franqueador, mas tal disposição, no propósito de obstar que alguém monte um negócio concorrente, também acaba causando problemas, posto que impossibilita ao ex-Franqueado expandir seus negócios na região que sempre atuou.
Cumpre ressaltar, entretanto, que a cláusula de não concorrência pode ser afastada pelo Franqueado, quando for caracterizada a culpa do Franqueador pela rescisão do contrato de franquia, visando o equilíbrio contratual, bem como em respeito ao princípio da boa fé que deve estar presente durante e após a execução dos contratos.
O descumprimento ocorre, por exemplo, por falta de assessoria, não entrega de mercadorias que são de obrigação da Franqueadora, desrespeito à cláusula de raio, inviabilidade da franquia, dentro outros.
Caracterizada a culpa da Franqueadora na rescisão do contrato de franquia, a jurisprudência tem afastado a cláusula de não concorrência, pois a mesma não pode persistir em prol da parte culpada (Franqueadora) em detrimento da parte inocente (Franqueado).
Qual o preço do arrependimento?
Mapa das Franquias: Em caso de arrependimento, que tipo de situação jurídica o franqueado pode esperar? E qual o cenário de prejuízos advindo desse tipo de decisão?
Thereza Curi Abranches: Se o arrependimento aconteceu antes da assinatura do pré-contrato ou contrato de franquia, o Franqueador não tem muito o que fazer ou exigir. Mas, se o compromisso já foi firmado, o que vai valer é o que já foi acordado sobre este aspecto. As situações e condições de rompimento dos contratos são bastante diversas. As cláusulas também variam para cada rede.
O Franqueador, normalmente assessorado por um advogado, coloca as condições mais convenientes, como multas, estabelecimento de lucros cessantes, sem prejuízo das perdas e danos que entender cabíveis, na medida em que o Franqueador pode deparar-se com uma situação que vai exigir novos investimentos em tempo para selecionar um franqueado para aquela determinada região.
A regra do jogo
Mapa das Franquias: Existe a possibilidade de o franqueado negociar algum tipo de mudança nas regras do jogo, alterações no relacionamento com a franqueadora ou essas condições são inalteráveis?
Thereza Curi Abranches: Na prática, na maioria das vezes, os Contratos de Franquia acabam se tornando verdadeiros “Contratos de Adesão”, ou seja, as regras do contrato de franquia são definidas pelo Franqueador. Portanto, o Franqueado deve ter a consciência de que não vai mudar condições e deve operar o negócio segundo os critérios e padrões pré-definidos contratualmente. Pensar em mudar as regras durante o jogo poder ser um risco para o investimento do Franqueado.
De todo modo, nada obsta que, se as partes acordarem sobre algum tipo de mudança, possam realizar um termo aditivo ao contrato de franquia em vigor.
Mapa das Franquias: Existe a possibilidade de a franqueadora comprar a unidade do franqueado de volta? O valor compensa?
Thereza Curi Abranches: Sim, existe esta possibilidade. A cláusula que fixa o “direito de preferência” objetiva garantir ao Franqueador a preferência, em detrimento de terceiros, na compra do negócio do Franqueado, caso este deseje vendê-lo para sair da rede.
Ocorre que muitas vezes essa disposição gera transtornos: ao Franqueador, quando o Franqueado a desrespeita e, ao Franqueado, quando o Franqueador usa tal poder para obstar a venda do negócio, fazendo supor que tem real interesse na aquisição quando de fato só quer dificultá-la para forçar a conservação do contrato.
Também é muitas vezes utilizada como ferramenta pelo Franqueador para tornar a franquia mais atraente, o que não significa necessariamente que haja interesse na recompra.
Além disso, nem sempre o valor compensa, na medida em que nas recompras por parte da Franqueadora, o valor repassado ao Franqueado costuma ser inferior ao valor que este receberia se vendesse sua unidade para outro Franqueado, por exemplo.
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