Estudo ABF/ESPM analisa desafio da construção de marca de franquias brasileiras no exterior

Marca, uma das essências do franchising, é o tema da 5ª edição do “Livro Verde”. A obra é intitulada A marca na internacionalização das franquias brasileiras. O estudo analisa os principais desafios para a construção das marcas nacionais no exterior. Dentre eles, destaca-se: comunicar ao parceiro internacional a respeito do know-how que resulta no sucesso da marca no Brasil; o necessário cuidado com a manutenção do núcleo padronizado do produto ou serviço por parte da empresa franqueadora, mesmo adaptando-o à cultura local, e a definição clara da estratégia de posicionamento no exterior.

Fruto de uma parceria entre a ABF – Associação Brasileira de Franchising e a ESPM – por meio do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) – o livro é assinado por Thelma Valéria Rocha Rodrigues, Eduardo Eugênio Spers, Felipe Mendes Borini, Vanessa Pilla Galetti Bretas, Pedro Lucas de Resende Melo, Mario Henrique Ogasavara e Adriana Camargo. Ele integra a série de estudos Internacionalização das Franquias Brasileiras, publicada no Livro Verde bienalmente desde 2010.

De acordo com os pesquisadores, alguns passos são fundamentais no processo de construção da marca no exterior. O primeiro a ser dado pela empresa franqueadora é a escolha da estratégia de internacionalização. Este passo deve ser seguido da decisão a respeito dos benefícios funcionais, simbólicos e experienciais que a marca quer ofertar. No primeiro deles, observa-se o atributo funcional do produto ou serviço, no sentido de resolver um problema ou suprir uma necessidade do consumidor; o segundo está relacionado aos símbolos que o produto ou serviço representa para os clientes e no terceiro caso, os benefícios estão ligados às experiências que a marca oferecerá aos clientes no momento do consumo. Além disso, a franqueadora deve definir a estratégia de posicionamento e desenvolvimento de um marketing mix competitivo.

Para a professora Thelma Rocha, “crescer no exterior é um desafio de longo prazo, que se constrói passo a passo, desde que se tenha um planejamento prévio”

De caráter qualitativo, o estudo envolveu entrevistas aprofundadas com quatro das 142 marcas brasileiras com presença internacional. Outras cinco redes com sólida experiência em países estrangeiros participaram das entrevistas do grupo focal que possibilitaram a realização da pesquisa: Chilli Beans, iGUi, Localiza, Nutty Bavarian e O Boticário.

A construção da marca no exterior foi apontada pelas empresas participantes do estudo como um processo contínuo de acertos e erros ao longo do tempo. Segundo o grupo de pesquisadores, com o tempo, essas redes ganham experiência sobre o que dá certo e o que não dá em termos de marca e calendário promocional. A vivência internacional também faz com que a empresa franqueadora saiba qual ação funciona para comunicação da marca em cada país, e qual não. O parceiro internacional pode auxiliar nesse processo. As redes de franquias brasileiras estão constantemente revisando o que não deu certo para seguir com o que está funcionando. É um processo contínuo de aprendizado, dizem os pesquisadores.

No franchising, observa Vanessa Bretas, gerente de inteligência de mercado da ABF, a marca possui um duplo papel: atrair o consumidor final e os potenciais franqueados. Nesse sentido, “as redes de franquia com uma percepção de marca forte apresentam maior tendência de expandir para mercados estrangeiros”, afirma.

Tendências  

O estudo aponta quatro tendências no processo de construção da marca brasileira no exterior. A primeira delas diz respeito às estratégias de comunicação e marketing, à utilização de canais digitais e de mídias sociais para apresentação da marca. “A internet está mudando o jeito de fazer negócios, de expandi-los, e o uso das mídias sociais é indispensável. Isso tem que ser considerado no processo de construção da marca”, ressalta Thelma Rocha.

A segunda tendência é a diversidade dos tipos de parcerias ou associação com outra rede local, com novos arranjos internacionais.

A terceira é a concentração estratégica de pontos de venda em uma determinada região que congregue o público-alvo da marca.

A quarta tendência é a adoção da estratégia de seguir o cliente (follow the client). Neste caso, a rede abre sua operação para atender uma comunidade de brasileiros no exterior, por exemplo.

“As marcas brasileiras seguirão a tendência de crescimento internacional e, beneficiadas pela maior maturidade do franchising brasileiro, de acordo as recomendações e os cuidados no planejamento, estrutura, gestão eficiente, correta seleção do parceiro local e adaptação à cultura e às leis do país almejado, estarão cada vez mais consolidadas no exterior”, completa Vanessa Bretas, gerente de inteligência de mercado da ABF.

Cuidados e recomendações

O cuidado com a cultura do país de destino foi destacado nos cinco livros verdes já publicados. Quanto aos benefícios que a rede quer ofertar ao mercado local, os cuidados, num primeiro momento, envolvem a seleção do parceiro, o registro da marca e a estratégia de co-branding, que ocorre quando ela se associa a uma ou mais marcas locais já conhecidas. “Mas, neste caso, tem que estar bem acertado a evolução ou término dessa associação para evitar riscos à consolidação da própria marca brasileira naquele país”, explica a professora.

Já para estruturar o posicionamento da franquia brasileira no mercado-alvo, outros cuidados são necessários. Segundo Thelma, na fase de introdução no país estrangeiro, a rede deve zelar por manter a essência da padronização do produto ou serviço, mesmo adaptando-o de acordo com as estratégias de ações de marketing definidas. “É fundamental manter o núcleo padronizado e ter cuidado com a adaptação local do marketing mix”, ressalta. Ainda segundo a especialista, se essa adaptação for excessiva, a internacionalização do produto ou serviço ficará comprometida e seus custos poderão aumentar. “Ninguém vai para um outro país e muda o tipo de negócio, a marca ou o seu posicionamento, do contrário não se constrói um negócio regional e muito menos global”, adverte a professora.

Principais mercados-alvo

Os Estados Unidos permanecem sendo o país mais desejado pelas marcas brasileiras (veja quadro abaixo). Berço do franchising e meca do consumo global, o mercado norte-americano atrai marcas de todo o mundo. “Os Estados Unidos são um mercado extremamente competitivo, cerca de 90% das marcas são locais, os custos para manutenção do negócio são, em geral, altos, portanto trata-se de um desafio acima da média”, observa Thelma. A recomendação da professora é que, em um estágio inicial de internacionalização, as redes optem por mercados mais próximos geograficamente, com uma cultura similar e, numa segunda etapa, quando a marca estiver mais madura internacionalmente, expanda para mercados de alta competitividade, como o norte-americano. Não por acaso, os dados de internacionalização apurados pela ABF em 2017 indicam que o Paraguai é o segundo destino das marcas brasileiras, com 34 redes estabelecidas, atrás apenas dos Estados Unidos, com 46.

São quatro as recomendações dadas pelos pesquisadores para a construção da marca internacionalmente:

1ª) Profissionalismo – não se deve abrir uma operação brasileira em outro país sem que a rede esteja preparada;

2ª) Seleção de um parceiro que seja comprometido com o crescimento da marca brasileira e assegurar esse compromisso contratualmente;

3ª) Ter cuidado com o co-branding: é preciso que a empresa franqueadora tenha um plano B e uma gestão qualificada e estruturada para monitorar a marca no exterior, além de uma estrutura de pós-venda e CRM.

4ª) Liderança: é necessário que a marca brasileira disponha de uma liderança local de longo prazo.

Evolução da internacionalização e segmentos que mais cresceram

Considerando todos os estudos da série Internacionalização das Franquias Brasileiras (de 2010 a 2018), a participação das redes nacionais no exterior variou de 65 para 142 marcas, um salto de 118% no período.    Entre os segmentos que mais cresceram, alguns não tradicionais, destacam-se: Outros – que engloba Informática, Hotelaria, Serviços e Limpeza –, cuja expansão atingiu 300% no período, Casa e Construção, 280% e Alimentação, 100%, este considerado um dos segmentos mais tradicionais no franchising brasileiro e mundial.

Em 2016, o estudo apontou que, em média, as redes brasileiras estavam no exterior há oito anos. Já nesta edição de 2018, a pesquisa indica que esse tempo de permanência subiu para dez anos. As cinco redes que participaram do grupo de foco do estudo estão presentes em mais de dois países e, em média, há dez anos.

Quanto aos estágios de internacionalização, que refletem o grau de comprometimento das empresas com suas operações no exterior, o estudo registra que, entre 2010 e 2018, houve um aumento de 56% das redes brasileiras no estágio 2 (envolvimento experimental), 27% no estágio 3 (envolvimento ativo) e de 16% no estágio 4 (alto comprometimento):

Metodologia

A série de estudos Internacionalização das Franquias Brasileiras, realizada em parceria entre a ABF – Associação Brasileira de Franchising e a Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), por meio do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) – Mestrado e Doutorado em Administração –, publicada no Livro Verde, é elaborada com base no Banco de Dados da ABF.

Por tratar de um tema relacionado à estratégia corporativa de cada empresa, a 5ª edição da série, intitulada A marca na internacionalização das franquias brasileiras, foi desenvolvida a partir de uma metodologia qualitativa exploratória. O estudo envolveu quatro entrevistas em profundidade com gestores de marcas de redes de franquias bem-sucedidas no exterior e um grupo focal com a participação de gestores de outras cinco marcas igualmente bem-sucedidas internacionalmente.

As empresas estudadas representavam uma população de 142 redes de franquias brasileiras com atuação em 100 países em 2017. Essa base está dividida em dois grupos: 129 redes de franquias brasileiras internacionalizadas com operação no exterior em 62 países e 18 redes de franquias brasileiras prioritariamente exportadoras.